Foi realmente a Copa das Copas. Para a Alemanha. No Brasil,
a seleção comandada por Joachim Low se sentiu à vontade para construir o
seu próprio centro de treinamento, dançar com índios, vestir a camisa
de clubes locais, torcer pelos anfitriões e até goleá-los por 7 a 1.
Para completar, superou a Argentina por 1 a 0 na prorrogação da final
deste domingo, no Maracanã, e garantiu o seu tetracampeonato mundial. O
gol histórico foi marcado por Gotze.
Para os argentinos, que passaram toda a Copa do Mundo
cantando que eram “papás” do Brasil por causa da vitória nas oitavas de
final de 1990 (em referência a uma questionável freguesia do rival), o
Mundial de agora teve o mesmo desfecho daquele de mais de duas décadas
atrás. O time sul-americano voltou a perder uma decisão para o europeu,
que havia derrotado em 1986. E já começou a se acostumar com o algoz,
pois caiu diante do mesmo adversário nas quartas de final de 2006, nos
pênaltis, e de 2010, com uma goleada por 4 a 0.
Desta
vez, a Alemanha encontrou tantas dificuldades quanto em 2006. Encontrou
uma Argentina bem postada na defesa e disposta contra-atacar com o
talento de Lionel Messi, eleito quatro vezes o melhor jogador
do mundo. O grande destaque da partida, entretanto, foi Gotze, que
aproveitou um cruzamento de Schurrle aos sete minutos no segundo tempo
da prorrogação, matou no peito e bateu cruzado para ser o carrasco
argentino no Rio de Janeiro.
Campeã em 1954, 1974, 1990 e agora 2014, a Alemanha chegou à quarta conquista
24 anos após a terceira, exatamente como haviam feito a também
tetracampeã Itália e o pentacampeão Brasil. Dessa maneira, tornou-se
ainda a única equipe europeia a levantar um troféu nas Américas, além de
ter impedido que os argentinos comemorassem o seu próprio Maracanazo no
estádio onde o Uruguai derrotou a Seleção Brasileira em 1950.
Alemães concluíram de maneira apropriada sua alegre e histórica passagem pelo território brasileiro-Fernando Dantas/Gazeta Press.
O jogo – Enquanto
pintava o seu rosto com as cores azul e branca em um dos banheiros do
Maracanã, um argentino comentava com outro que, mais uma vez, o público
brasileiro estava contra a sua seleção. “Deixem estar. Foi assim em
todos os jogos que ganhamos”, gargalhou o segundo, enquanto os
torcedores locais enalteciam os mil gols de Pelé e chamavam Maradona de
“cheirador”.
Não demorou muito para os argentinos abafarem a
cantoria dos brasileiros nas arquibancadas. Com muita intensidade, eles
bradaram o provocativo hit sobre a Copa do Mundo de 1990, ironizaram
quando Neymar apareceu nos telões do estádio e ovacionaram na hora em
que a imagem foi substituída pela de Messi. Continuaram empolgados ao
assistir ao zagueiro espanhol Carles Puyol levar o troféu do Mundial a
campo ao lado do modelo brasileira Gisele Bundchen e no instante em que o
azarado roqueiro Mick Jagger e as autoridades de outros países eram
recepcionadas pela presidente Dilma Rousseff.
O que todos queriam
realmente ver, no entanto, eram os jogadores finalistas. Passada a
cerimônia de encerramento da Copa do Mundo, as seleções de Alemanha e
Argentina foram juntas a campo e trocaram os últimos abraços antes de
começar a lutar pelo troféu mais cobiçado do futebol. Com tanto empenho
quanto o de quem gritava do lado de fora do gramado. Foram muitas as
divididas ríspidas nos primeiros minutos de decisão.
Credenciada
pela sua boa campanha na Copa do Mundo, a Alemanha tomou a iniciativa de
atacar. Mas se mostrou um pouco desorientada com seguidos erros de
passes dos zagueiros Hummels e Boateng. No meio-campo, não estava
Khedira, que chegou a ser anunciado como titular e contundiu a
panturrilha direita no aquecimento. Acabou substituído pelo jovem
Kramer.
Já a Argentina se armou para tirar proveito de qualquer
vacilo alemão. Escolado pela goleada de 7 a 1 que o Brasil sofreu contra
o mesmo oponente, o técnico Alejandro Sabella manteve a força defensiva
de sua equipe e a preparou para os contra-ataques. Foi em uma investida
rápida que Higuaín descobriu o melhor caminho para o gol – o lado
direito –, invadiu a área e finalizou cruzado. A bola não saiu nem pela
linha de fundo, porém levantou de vez o público celeste.
Kramer,
ao contrário, foi ao chão. O substituto de Khedira chocou o seu rosto
com o ombro de Garay e ficou tão grogue quanto os jogadores brasileiros
que beberam as águas batizadas oferecidas pelos argentinos no histórico
confronto de 1990. A ponto de apenas assistir a uma cobrança de falta da
Argentina e ser empurrado por um companheiro para acordar. Não
adiantou. Pouco mais tarde, teve de sair de campo amparado para a
entrada de Schurrle.
O time argentino foi ao ataque diante da
momentânea tontura alemã. Aos 20 minutos, Kroos errou um cabeceio para
trás e deixou Higuaín à frente do goleiro Neuer. O centroavante
desperdiçou a melhor chance de gol até então ao concluir para fora. Aos
29, em uma nova oportunidade, ele recebeu cruzamento rasteiro da direita
(sempre por lá) de Lavezzi e comemorou furiosamente ao completar para a
rede. Em posição de impedimento.
Percebendo que a Argentina
crescia em campo, a torcida brasileira aumentou o tom nas arquibancadas.
“Pentacampeão!”, gritava, para apoiar o time que aplicou o maior vexame
da história da Seleção. O incentivo foi premiado com uma grande jogada
pela esquerda de Muller, aos 36 minutos. Em sua primeira participação na
partida, Schurrle correu para arrematar e obrigou Romero a fazer grande
intervenção.
Lionel Messi teve bons momentos, mas mostrou limitações físicas e não conseguiu decidir-Fernando Dantas/Gazeta Press.
A
partir dali até o final do primeiro tempo, a decisão ficou aberta.
Messi chegou a passar por Neuer – pela direita – em uma arrancada, mas
esbarrou na zaga alemã. Do outro lado, já nos acréscimos, Howedes
respondeu cabeceando a bola na trave depois de cobrança de escanteio.
Muller, impedido, tentou ficar com o rebote na pequena área e deixou a
impressão de que o jogo se tornaria ainda mais emocionante após o
intervalo. Os times desceram para os vestiários sob aplausos.
Na
volta, Sabella confiou em Aguero, recém-recuperado de lesão muscular,
na posição de Lavezzi. E quase celebrou um gol logo no primeiro minuto.
Messi recebeu a bola de Biglia, invadiu a área com liberdade e ficou em
ótima posição para abrir o placar. O chute de chapa, cruzado, passou
muito perto da trave. Joachim Low, até então calmo no banco de reservas,
assustou-se e foi para a beira do campo.
Com o tempo, no entanto,
as jogadas técnicas rarearam. A tensão das duas seleções em uma final
de Copa do Mundo foi extravasada com uma sequência de lances violentos.
Neuer fez novas vítimas com as suas já tradicionais saídas estabanadas
do gol, e Mascherano comandou as faltas mais duras do lado da Argentina.
Messi, por sua vez, sumiu um pouco com a mudança de panorama da final –
talvez por cansaço. A torcida do time sul-americano notou e gritou o
nome do seu principal jogador, fazendo gesto de reverência com os
braços.
Sabella revolveu dar nova companhia ofensiva a Messi,
substituindo o esforçado e aplaudido Higuaín por Palacio. Ainda assim, a
Alemanha voltou a ser mais presente no ataque. Só teve o seu volume de
jogo interrompido por um torcedor que invadiu o gramado, aos 36 minutos,
e pela última alteração da Argentina. Pérez cedeu a sua vaga para Gago.
Low também mexeu em sua equipe, trocando o veterano goleador Klose por
Gotze.
As mudanças não se refletiram no marcador do período
regulamentar. Exaustos, os argentinos que bateram a Holanda nos pênaltis
nas semifinais teriam que disputar mais uma prorrogação. A Alemanha,
embora já não gozasse do mesmo fôlego de antes, havia ganhado com folga
do Brasil na fase anterior e teoricamente teria mais forças para o tempo
extra.
Foi o que se viu no primeiro ataque da etapa inicial da
prorrogação. Schurrle fez ótima tabela pela esquerda e bateu de primeira
de dentro da área. Romero deu um rebote perigoso, espanado pela defesa
da Argentina – novamente conformada em jogar à base de contragolpes.
Pela Alemanha, a pressa era tamanha que até Neuer cobrava lateral.
À
exceção de uma chance para Palacio (que encobriu o goleiro alemão com
muita força), contudo, a primeira parte da prorrogação não teve novas
grandes possibilidades de gol. Na segunda, chamou a atenção um corte no
rosto de Schweinsteiger, que sangrou abundantemente após uma disputa de
bola com Aguero. Pouco depois, ele e todos os alemães ganharam um motivo
para deixar também as lágrimas caírem. De alegria.
Coube a Gotze marcar o gol que deu o tetracampeonato mundial à merecedora seleção alemã-Fernando Dantas/Gazeta Press.
Aos
sete minutos, Schurrle avançou pela esquerda e fez o cruzamento. Gotze
aproveitou o mau posicionamento da defesa argentina, dominou a bola no
peito e desferiu um chute cruzado para repetir o placar da final da Copa
do Mundo da África do Sul no Brasil. Era o que faltava para os
brasileiros novamente gritarem para celebrar Pelé, ainda com mais
títulos mundiais do que a Argentina. E para os "papás" cantarem o
merecido tetracampeonato em sua Copa das Copas.
Helder Júnior e Tossiro Neto, enviados especiais Rio de Janeiro (RJ) - GAZETA ESPORTIVA.
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